Por Lejeune Mirhan
Conforme mais ou menos previsto, após um suspense de 20h entre a noite de seu pronunciamento na TV estatal no dia 10 de fevereiro passado, finalmente Hosni Mubarak resolveu renunciar, passando o poder do Estado egípcio para as mãos do Alto Comando das Forças Armadas do país. Dito de outra forma, a continuidade se dá na forma de um golpe militar. Repercussões de grande monta e quero compartilhar com meus leitores muitas reflexões que fiz nessa semana a partir de análises e leituras sistemáticas que realizo.
Já se falou que as ditaduras dos países árabes – honrosa exceção da Palestina – são na verdade de dois tipos de monarquias. Uma do tipo absolutista, onde nem sequer parlamento funciona e o rei, o sheik, o emir, o sultão, o príncipe ou qualquer outro nome que tenha o cargo manda de forma total e absoluta. As outras são monarquias “constitucionais”, por assim dizer, ou seja, apresentam-se como “repúblicas”, possuem presidentes “eleitos”, que muitas vezes se eternizam no poder, como Muammar Khadafi, da Líbia que governa o país “republicano” há “só” 42 anos ou indicam seus próprios filhos para sucedê-los.
No último e histórico dia 11 de fevereiro, às 14h no Cairo (18h no horário de Brasília), a Praça Tahrir (Libertação em árabe) virou uma festa. Havia sido anunciado, num comunicado lacônico de 50 palavras, pelo “vice” presidente, Suleiman, que Hosni Mubarak havia deixado a presidência que seria agora entregue a um “conselho supremo militar”, uma espécie de junta governativa, composta por nove generais, marechais e brigadeiros, todos – sem exceção – nomeados pelo ditador que “deixava” o poder. Ele e seus prováveis 50 bilhões de dólares depositados em contas numeradas na Suíça (que, aliás, já se dispôs a bloquear todos esses recursos).
Um novo quadro se abriria a partir daí. Num primeiro momento, a população ficou feliz, comemorou, fez festa, dançou e cantou. Fez congraçamento com soldados e oficiais do exército, que estavam acantonados na Praça desde 25 de janeiro. No entanto, num segundo momento, as lideranças, partidos e organizações de massa que conduziram a luta do povo – que a imprensa insiste em dizer que “não havia líderes” – deram-se conta que o ditador na verdade não havia caído. Apenas deixou o poder, transferiu-o para gente de sua absoluta confiança. Junta militar sob a coordenação do Marechal de Campo Tantawi, fiel serviçal do ditador (conhecido como poodle de Mubarak) e defensor dos acordos de paz com Israel e militar com os EUA. Avesso a qualquer reforma democrática. Sabe-se que ele é muito próximo do reacionário e conservador Robert Gates, chefe do Pentágono.
Uma junta que passou a governar por comunicados, numerados, como se fossem boletins de juntas médicas que relatam a agonia dos pacientes nos hospitais. Os egípcios deram-se conta de que poderia até ter caído o ditador, mas o regime dava fortes sinais de que continuaria. Pouca ou quase nenhuma alteração havia sido feita. O governo interino, provisório, de civis e de lideranças e de entidades havia caído por terra. Não se fala mais nisso.
Num dos comunicados da junta militar são concedidos 10 dias de prazo para uma comissão de notáveis juristas, de oito membros (sendo um cristão coopta), para emendar a velha e carcomida constituição de forma a ser referendada em 60 dias e novas eleições seriam convocadas a partir disso. Não se fala em constituinte. Nenhum preso político – os milhares antigos e as centenas de novas prisões dos 18 dias de lutas – foram libertados. Nada de anistia. Estado de emergência – que permite prisões sem mandato por tempo indeterminado – continua sem ter sido modificado. Partidos políticos banidos seguem sendo proibidos, em especial os socialistas, comunistas e a Irmandade Muçulmana, pintada como o pior dos males a ser evitado.
Comentários e Desdobramentos
Como sempre, a efígie de Obama moveu-se. Acabou por apoiar a solução, de toda altamente interessante para os EUA. É preciso registrar que nos 18 dias de luta revolucionária do povo egípcio, em nenhum pronunciamento – quase que diário – do presidente dos Estados Unidos, a palavra “eleições livres” foi utilizada. Nem pela senhora Clinton ou pelos porta vozes da Casa Branca. Essa é a concepção estadunidense de democracia. Só serve quando o ditador lhes é amigo, não importa se as eleições são de fachada ou que a democracia inexista. Como diz Pepe Escobar, o grande sonho americano, teria sido implantar no Egito algo parecido com o modelo paquistanês, com elites compradas, um islã político moderado, uma inteligência militar e um general ditador.
Sem exceção, todos os governos árabes pró-americanos da região, segundo o Prof. Sami Moubayed, em artigo no Asia Times (9/2), tem como características em comum:
1. Sempre combateram o comunismo desde a chamada guerra fria;
2. Desde 1979, combateram o Irã de Khomeini;
3. Tudo fizeram para liquidar o islã político, a que chamam de “fundamentalista”, em especial depois do 11/9 em Nova York;
4. Sempre adotaram posições contrárias aos movimentos sociais, em especial contra os sindicatos;
5. Atuaram sempre contra as resistências libanesa e palestina.
Uma revolução em curso?
Um debate que já se coloca no momento, em especial na esquerda marxista, é se esta em curso no Egito uma revolução ou não. Como disse Lênin, as condições objetivas para que uma revolução aconteça é que “os de cima não mais conseguem governar como antes e os de baixo já não aceitam ser governados como antes”. Assim, objetivamente falando, há uma situação revolucionária criada no Egito. Resta-nos saber para que rumo ela pode pender neste momento e qual será mesmo o seu caráter.
Nesse sentido, entendo que as causas objetivas do processo revolucionário, com pitadas de subjetividade por assim dizer, podem ser assim resumidas:
1. Miséria e desemprego elevados;
2. Corrupção e Nepotismo de forma escancarada;
3. Ausência completa de qualquer tipo de liberdade, em especial para as organizações de massa da sociedade e aos partidos e imprensa;
4. Imensa desigualdade.
De meu ponto de vista, há sim um processo revolucionário em curso. Sua liderança vem sendo disputada, basicamente entre três campos distintos. Um deles – ainda que defenda uma linha mais nacional e secular – tem estilo e propostas mais conservadoras. Como dizia o romance de Giuseppe Tomasi Lampedusa, O Leopardo, “é preciso mudar para que tudo fique como está”. Tem forte presença militar e não alteraria o status quo em vigor, qual seja, de manter o Egito sob completo domínio dos Estados Unidos, como país estratégico em termos de área de influência americana e que protegeria Israel na região.
Uma segunda linha, de caráter mais religioso, constitui de certa forma um outro campo. Pode ser polarizado pela Irmandade Muçulmana, fundada em 1928 e que esta proscrita no país desde 1952 quando Gamal Abdel Nasser assumiu o comando do país. Quase não esteve na linha de frente dos protestos, mas é muito forte no país, pela assistência social que pratica. Com candidaturas avulsas ou por outros partidos, conseguiu, nas eleições de 2005, fraudadas, ainda assim, fazer 20% das cadeiras (algo como uns 80 deputados). Esse parlamento foi dissolvido pela junta militar. Analistas estimam que em eleições diretas eles poderiam chegar a 30% dos votos. Tem vies fortemente conservador em termos de costumes, ainda que possa abraçar a causa nacionalista.
Por fim, há um campo que chamamos de nacionalismo laico, de caráter mais progressista e popular. Ele talvez pudesse reeditar o que um dia se chamou de pan-arabismo, criado por Nasser. Esse campo, ainda não de todo unificado, englobaria as organizações sociais de massa, de jovens, mulheres e sindicatos combativos, partidos mais progressistas, os socialistas e comunistas. Uma plataforma mais avançada chegou a ser esboçada por diversas organizações desse campo, mas ainda não pode ser implantada pela passagem do poder aos militares. Até setores do Islã que não defendem o estado islâmico (sunitas), poderiam fazer uma composição que fortalecesse esse campo. Não é de todo impossível que os muçulmanos se aliem a esse terceiro bloco, se unificados forem para as eleições presidenciais. Como afirma Pepe Escobar, "a revolução egípcia não seria violenta, sectária, islâmica e hierárquica”.
Quanto à questão que a mídia propagou de uma revolução sem “lideranças” e mais de Internet (absurdo isso, até porque menos de 20% da população tem acesso à internet e apenas um terço possuem celulares), do Facebook e do Google como chegaram a dizer, o Bloco Patriótico e o Bloco Democrático, que reune mais de uma dezena de grandes partidos e entidades, apresenta, de forma resumida, a seguinte plataforma que os unifica:
1. Fim das leis de emergência;
2. Liberdade de Todos os Presos Políticos (novos e antigos, Anistia Ampla);
3. Dissolução do Parlamento (atendido pela junta militar);
4. Formação de um Governo Provisório de unidade nacional, com uma construção coletiva;
5. Apuração de todos os abusos das forças de segurança (o balanço oficial é de pelo menos 365 mortos, assassinados pela política e mais de cinco mil feridos);
6. Eleições livres, limpas e democráticas com pleno funcionamento de todos os Partidos;
7. Constituição de um grupo de trabalho que faça uma proposta de uma nova constituição, a ser eleita por uma constituinte (atendido parcialmente pela junta);
8. Ampla liberdade de imprensa e de opinião;
9. Liberdades sindicais e direito de greve e
10. Abolição das cortes militares.
De fato, tal programa, bastante avançado para o Egito e a região como um todo, unificaria todas as forças patrioticas e populares egípcias. Mas, como um ou outro desses dez itens contemplados, os militares não dão nenhum sinal de que concordam com esse programa de transição. A vida e a história vai nos comprovar se essa Revolução Árabe terá mesmo um caráter progressista, popular e mesmo socialista. No momento, as coisas ainda não estão claras qual linha será seguida.
De uma coisa pelo menos estamos de acordo: a liderança do movimento procurou ser ampla, sem sectarismo, envolvendo todas as tendências, forças políticas e religiões, ainda que discordando dos militares, nunca fechou as portas para o diálogo, organizou amplas paralisações do trabalho e em fábricas estratégicas (como veremos a seguir) e usou adequadamente as comunicações eletrônicas em seu benefício (mensagens de celulares e Internet com as redes sociais).
O papel dos Trabalhadores e dos Sindicatos
Durante os quase trinta anos da ditadura de Mubarak, os sindicatos foram controlados a ferro e fogo. A central sindical oficial é extremamente moderada e pró-governo. Chama-se ETUF, que na sigla inglesa quer dizer Egipcian Trade Union Federation. Tal entidade não convocou nenhuma manifestação durante as mobilizações populares e em 27 de janeiro chegou a emitir uma nota dizendo que faria de tudo para “conter os protestos dos trabalhadores”.
Houve um racha no movimento sindical e uma nova organização surgiu nas lutas, capitaneadas pelos sindicatos independentes de servidores públicos, da área da saúde e alguns de origem operária. Desse movimento, surgiu a Federação dos Sindicatos Independentes do Egito. Os sindicatos de profissionais liberais – que são fortes nesse país e possuem modelo parecido com os que temos no Brasil – estiveram na linha de frente das manifestações. Em especial os sindicatos de médicos, advogados e engenheiros. A prova da força desses sindicatos é a nota da Junta Militar, em seu 5º comunicado, que exorta aos trabalhadores “operários e aos profissionais” a que voltem ao trabalho e encerrem as greves.
É preciso destacar que num processo revolucionário geral que vive hoje o Egito, isso também se verifica na esfera sindical. A maioria dos sindicatos são controlados por sindicalistas ligados ao Partido do ditador Mubarak, o Nacional Democrático. Nesse processo, sindicatos foram ocupados e muitas direções foram destituídas. Novas entidade foram formadas.
A grande imprensa escondeu, durante a maior parte do tempo, essas mobilizações operárias e proletárias em geral. Mas, foram registradas grandes mobilizações dos operários têxteis da região do Delta do Nilo na cidade de Mahalla, com milhares de operários (a maior concentração operária do Norte da África e mundo árabe); trabalhadores em telecomunicações se mobilizaram; bem como os do setor de limpeza; professores universitários decretaram greve geral; jornalistas tomaram de volta seu sindicato histórico; ferroviários paralisaram atividades; fábricas e instalações industriais foram ocupadas; federação dos aposentados saíram ás ruas. Tudo isso, de modo geral, podemos dizer que o processo revolucionário em curso chegou às fábricas e locais e de trabalho. Vários comitês revolucionários foram criados no processo.
Os operários das cidades de Suez, Port Said e Ismaillia, metalúrgicos e siderúrgicos paralisaram a produção. Os seis mil trabalhadores públicos do Canal de Suez cruzaram os braços. Nessa região concentram-se grandes estaleiros, que interromperam suas atividades. Operários das empresas de Carvão e Cimento, no distrito de Halwan também suspenderam o trabalho. Papel de destaque tiveram os petroleiros, que desafiaram o ministro do Petróleo, Sameh Fahmy. São operários da estatal PetroTrade Companhy e as Petroment e Syanco. Ferroviários exigiram a participação nos lucros das empresas. Os motoristas e condutores das empresas públicas de ônibus do Cairo aderiram ao movimento paredista. Enfim, pode-se dizer que o processo em curso contou com elevada participação do proletariado egípcio.
As reivindicações gerais das organizações sindicais em luta podem ser resumidas em: 1. Direito ao Trabalho; 2. Salário Mínimo de 150 Euros; 3. Direito à Proteção Social (moradia, educação, transportes e saúde de boa qualidade); 4. Liberdade Sindical e 5. Libertação de todos os presos, em especial, sindicalistas.
Do ponto de vista da solidariedade operária e proletária internacional, devemos somar nossas vozes do sindicalismo classista com a revolução no Egito, gritando em alto e bom som: Tirem as Mãos do Egito! Abaixo o Imperialismo! Solidariedade com a Revolução Egípcia! Nossos corações de trabalhadores batem forte com os egípcios. Como diz o blogueiro egípcio Honam El Hamalawy, “agora as fábricas têm que ocupar a Praça Tahrir”.
Autores que merecem registro
Como sempre fiz semanalmente para produzir meus escritos sobre OM, leio dezenas de artigos que nos chegam (em especial pelo coletivo de tradutores da Vila Vudu). Outros são mesmo autores nacionais. Compartilho com meus leitores alguns comentários com os quais me identifico:
Gilbert Achcar, da School of Oriental and African Studies de Londres, que diz “para impor mudança tão ampla, o movimento de massas egípcio teria que quebrar a espinha dorsal do regime, que é o seu exército”. E, claro, não há a menor condição de que isso ocorra. A tomada da “Bastilha” egípcia não aconteceu. Pelo menos não por enquanto.
Nabil Shawkat do Ahram Online, que diz “o espírito do governo de Hosni Mubarak, a essência de seu regime, seus métodos estão longe de acabar”. Isso reforça o que dissemos anteriormente, qual seja, que o ditador caiu mas as mudanças do regime foram pontuais.
Immanuel Wallerstein (citado por Antonio Luiz M. C. Costa, de Carta Capital de 16/2, pág. 39), “os EUA, aflitos para ficar ao lado dos vencedores, mas sem saber exatamente quais serão e sem querer perder o apoio dos ditadores e monarcas absolutos de que ainda julgam precisar, fazem do Irã e da Turquia os dois maiores ganhadores com o processo revolucionário que agita os países árabes”.
Aqui é preciso registrar ainda – comentário que li em diversos ensaios – que duas grandes “teorias” caíram por terra com esse processo revolucionário egípcio. A primeira, que já estava praticamente morta, de Francis Fukuyama, com o livro “O Fim da História”. E a segunda, de Samuel Hungtinton, com o “Choque de Civilizações”. O primeiro de 1989 e o segundo de 1996 – li ambos, sendo que o segundo, ainda em inglês, na Foreing Affairs publicado em forma de artigo – com o título Clash os Civilization.
Por mais que Obama e seu antecessor Bush (filho) falem em “levar democracia para o mundo árabe”, as suas duas e desastrosas experiências desse processo dito democrático, feito na bala e com bilhões de dólares de gastos e milhares de vítimas americanas estão sendo vividas há oito anos no Iraque e há dez anos no Afeganistão. O Egito, com todas as limitações da junta militar, deve aprofundar a sua democracia num prazo máximo de um ano, como jamais se viu em toda a sua própria história moderna. Isso, sem dúvida, deixa a tríade Washington, Riad e Telavive em completo desespero.
Não nos esqueçamos jamais que tanto o governo israelense de Benjamin Netanyahú, como a monarquia absolutista e pró-americana da Arábia Saudita, trabalharam dia e noite, de forma incessante, para que Hosni, seu queridinho, seguisse à frente do governo egípcio. Foram fragorosamente derrotados.
Algumas conclusões
Como faço sempre, nesses artigos mais analíticos que tenho produzido, apresento aos leitores algumas conclusões. São elas:
1. A questão central continua sendo os rumos que o novo governo, seja ele militar ou civil, irá adotar com relação aos acordos de paz com Israel de 1979. Se eles serão mantidos ou não. Isso tem reflexos nos acordos militares de cooperação com os Estados Unidos. Dito de outra forma, por mais moderado que venha a ser o novo governo, será muito difícil que ele seja completamente subordinado à política externa dos Estados Unidos. Ou ainda, como diz o Prof. Reginaldo Nasser (PUC/SP), não peitar os EUA, não significa necessariamente apoiar o massacre dos palestinos, como fazia Mubarak ou aceitar o dinheiro sujo estadunidense para o setor militar dos EUA, não significará necessariamente subserviência aos americanos. O certo é que os Estados Unidos não mais conseguirão manter a sua hegemonia regional da forma e com a intensidade que tinham antes;
2. Como diz Escobar, é possível que tanto a junta militar, como o novo governo civil, possa ajudar mais os palestinos, abrindo a fronteira com a Faixa de Gaza na cidade de Rafah. É possível ainda que o subsídio da venda do metro cúbico do gás para Israel, que é subsidiado, sofra reajustes e, por fim, os navios americanos que cruzam o Canal de Suez passem a pagar tarifas de pedágio. Tudo isso, são derrotas para Israel e os EUA, ainda que possa não ocorrer um rompimento formal;
3. Apesar de amplamente desmentido, de entrevistas de seus dirigentes em vários órgãos de mídia, a Irmandade Muçulmana não prega a existência de um “estado islâmico”, nos moldes do Irã, para a realidade do Egito (como, aliás, no Líbano a mesmo coisa, com relação ao Hezbolláh);
4. Continuo não tendo dúvida alguma – e Nasralláh do Hezbolláh libanês também não as têm, como diversos outros analistas internacionais – de que o grande derrotado até o presente momento segue sendo Israel, seguido da Arábia Saudita, Jordânia e Iêmen;
5. As massas árabes, em particular as egípcias, por mais combativas e revolucionárias que tenham sido nesse período, não venceram, não derrotaram o exército do Egito;
6. As elites egípcias – percentualmente muito menor em termos populacionais do que no Brasil, por exemplo – tudo farão para que a revolução, de caráter mais popular e progressista – quiçá socialista – seja derrotada;
7. Continuo achando que o nacionalismo árabe, o pan-arabismo, fundado por Nasser, voltou a crescer e se fortalecer. Poderá jogar papel mais preponderante. Esse nacionalismo se expressa pela defesa da soberania e da independência de todos os países árabes, respeito aos direitos de seu povo, solidariedade ao povo palestino;
8. É crucial que as organizações de massa, os sindicatos, os partidos políticos organizados mantenham a pressão das ruas pelo fim do regime, pelo afastamento da junta militar e pela imediata e verdadeira democratização do país;
9. Como diz Marwan Bishara, editor de política da Al Jazeera, o que agora mais se ouve na Praça Tahrir e nas ruas do Egito é a expressão em árabe ma-shallah que quer dizer “essa é a vontade de deus” em oposição ao tradicional e conformista in-shallah que quer dizer “se deus quiser”. É o novo ânimo redobrado das massas;
10. Por fim, como diz um dos melhores estudiosos e analistas do OM, Pepe Escobar, “se a Comuna de Paris falhou, segundo Marx, em 1871 foi porque não marchou sobre Versailles, dando tempo à contra-revolução para se organizar; a jovem revolução egípcia vem optando em não confrontar com o regime e a junta militar; todo cuidado é pouco”. Estou de pleno acordo. Só as grandes mobilizações das massas árabes poderão assegurar as vitórias do povo árabe.
Rádio França Internacional
Esta semana, concedi à jornalista brasileira Lúcia Fróes, de Paris, uma entrevista à Rádio França Internacional. Essa rádio é uma espécie de BBC francesa e é difundida para vários idiomas de todo o mundo. Espero que gostem e estejam de acordo e, quando for o caso, me enviem comentários. É uma análise do momento específico de incertezas e inseguranças que tod@s que lutaram nas ruas árabes e egípcias vivem em função da tomada de poder pela junta militar. A entrevista pode ser ouvida pelo endereço http://www.portugues.rfi.fr/geral/20110215-egito-precisa-de-eleicoes-livres-diz-analista
* Sociólogo, Professor, Escritor e Arabista. Membro da Academia de Altos Estudos Ibero-Árabe de Lisboa e da International Sociological Association e colunista da Revista Sociologia da Editora Escala. E-mail lejeunemgxc@uol.com.br
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