quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Desejos são só para serem desejados, nunca realizados?

Giovani Santos*


              Era uma areia branca e fina. O mar estava leve, sublime. Havia muitos coqueirais, estes, testemunhavam pequenos barcos que os pescadores usavam, mas que naquele dia, apesar de ser muito cedo, esses não os possuía. Só consegui sentir os pedregulhos em meus olhos, quando, por muito pouco, ainda não estava morto. A praia, ah praia! Quando, não tão boa para um devido suicídio, serve para levar a família, os amigos, ou quem você quiser para tomar banho. Levar um bronze...
                
                Tudo acontecera há uma semana, eu, passeando pelas areias da praia, perto de minha casa, encontrei uma garrafa de ouro de onde saiu um grande gênio. Naquele instante, fiquei paralisado, não sabia o que fazer, tentei correr, mas o medo não me permitia. De repente, ouvi uma voz estridente, era a voz de um grande homem, que naquele momento, saia da preciosa garrafa.

- Você me libertou! Tem direito há alguns desejos.
Disse o gênio, num tom bem arrogante.
- Direito a desejos? Há muito não ouvia isso: direito, desejos...
Essas palavras soaram como um belo beijo, quem sabe de uma mulher, virgem e bela.
Pois bem! Disse eu, já que é de direito, farei alguns desejos.
- Tu terás direito a dois desejos, apenas dois desejos.
- Não sei o que desejar! Deixe-me pensar.
- Não tens muito tempo, como você pode não ter desejos?
Os desejos pertencem, pela própria inerência, aos seres humanos. Como não pode conseguir pensar em desejos?
- Tenho muitos desejos, porém, como só posso realizar dois de meus milhares, não sei o que pedir. Talvez peça um que possa confortar outros três desejos, mas como farei isso?
- Vocês humanos, tem uma infinidade de desejos, sei muito bem disso. Em geral, sua realização traria uma série de problemas sociais, pois da maneira que foi arquitetado o estatuto da humanidade, os desejos, que são da natureza humana, não poderiam ser realizados. Quando nos referimos a tais desejos, fazem-se necessários alguns esclarecimentos:

                Os desejos conscientes são aqueles que transitam subliminarmente pelo aparelho psíquico, podem ser sexuais, ou, o contrário. Esse primeiro pode ser acompanhado de ereções ou lubrificações, o segundo é repleto de infinidades, pois a vida dos seres não passa de um projeto narcisista. O que se quer é apenas sentir, desejar, ter desejos de desejos. Esses, muitas vezes inconscientes, são reprimidos, pois por convenção eles fariam mal a toda a sociedade.

- Mas o que farei? Penso não em um desejo, mas em um projeto?
- Os neuróticos, se protegem de seus desejos, tratando-os como se fossem projetos, planos a seres materializados. Enquanto que um indivíduo, não neurótico, sadio psiquicamente, trataria como um simples e inofensivo desejo. disse o gênio parecendo ser meu analista.
- O que você quer dizer? Eu não desejei nenhum psicanalista e, além do mais, não sou neurótico. Pensar em um desejo não é imoral. Imoral, poderia ser realizar o tal desejo.
- Só estou esclarecendo algo sobre os desejos, não sou seu tutor, apenas estou alertando para o cuidado com o que você deseja.

                 Certa vez, um casal me libertou dessa garrafa e pediu que lhe realizasse alguns desejos. Eles desejaram ter de volta, seu filho que morrera na guerra. O desejo foi realizado e os entreguei o cadáver dele.

                Outra vez, há muito tempo atrás, um homem, que por haver desejado ser dono de muito mais do que tinha, correu o risco de morrer de fome. Um sátiro (na mitologia grega, os sátiros eram entidades da natureza, com o corpo metade humano, metade bode), leal e inseparável amigo de Dionísio (o Baco dos Romanos, deus protetor do vinho e dos banquetes), foi hospedado pelo rei de Midas, que logo o entregou de volta ao seu melhor amigo. O deus, para recompensá-lo da ótima hospitalidade servida ao seu amigo, prometeu que lhe daria qualquer coisa que desejasse.

                Diante de tal promessa, um rei sábio teria pedido: tornar-se ainda mais prestigioso e imbatível ou ficar continuamente, bem visto entre os deuses. Midas, ao avesso, demonstrou que para ele, a única coisa que valia no mundo era o ouro. Assim sendo, pediu a Dionísio o poder de transformar em ouro tudo que tocasse. Todo fruto, todo objeto, todo alimento que Midas tocava transformava-se em ouro.

                Quando o Rei Midas encontrou-me e tocou em minha garrafa, transformou-a em ouro, de todo modo, nada me afetou. Daí, ele me pediu que lhe desse o desejo de ter desejos, Pois tornar tudo em ouro não era mais o que ele queria.

- Não sei, mas, esta manhã, acordei com o desejo de nunca mais amar? Disse eu com um ar meio enfadado.  
- Desejo concedido. Agora tens apenas um desejo.
Nesse momento, um vazio absurdo tomou conta de mim, era como se tudo deixasse de fazer sentido, por conta do meu não amar. Será que desejei errado? Será que não explicitei, o quê não queria amar? E agora o que farei? Desejarei o reverso? E o quê seria o verdadeiro reverso do amar?
- Nunca me senti tão mal. O que farei com esse tal sentimento?
- aquele que deseja errado, deverá sofrer com esses efeitos: angústias, agonias, irritações, depressões... disse o gênio.
- Não estou aguentando tal dor.
- Trata-se de administrar tal sofrimento, e, a partir de agora, muita solidão.
- Desejo não ter o desejo de viver.
- Desejo concedido.

                Senti o gosto do não existe, do não ser, desfaleci. Encontrava-me totalmente deteriorado na praia. Morto, porém vivo, pois possuía a visão de ver toda a minha desgraça. Desejos são só para serem desejados? Nunca realizados? Acordei e vivi.




* Escritor Filosofante de Olinda




3 comentários:

Jelsimar P. Pimentel (Mazinho) disse...

ta muito bom esse conto giovani
parabéns cara

Unknown disse...

Acordei e vivi. O melhor de tudo é poder recomeçar....Parabéns ,amei seu texto. |Bjos Marta. facebook.com/martaurquisa

Débora Fidelis disse...

nossa que gênio é esse?ele diz:realizarei três desejos,o no entanto faz dos desejos concebidos,análises filósoficas,divã...

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